terça-feira, 27 de outubro de 2009

Don Camillo e seu Pequeno Mundo


Superando as Diferenças
O mundo de Don Camillo, de Giovannino Guareschi
Por Elizabeth Lev

ROMA, quinta-feira, 6 de agosto de 2009 (ZENIT.org).- O poeta romano Horácio registrou em sua lírica o tempo mágico do “otium”, um período de pacífica ociosidade e descanso que permite o fortalecimento espiritual para o dia-a-dia. Pretendo usar este tempo de tranquilidade para a leitura, e, nestas férias de verão europeu, eu felizmente abri o primeiro livro que despertou minha paixão pela Itália.

“Don Camillo e o seu pequeno mundo”, escrito pelo italiano Giovannino Guareschi, oferece uma refrescante perspectiva da política, religião e amizade em uma idade em que estes três campos parecem irreconciliáveis. As histórias de Guareschi, escritas quando as paixões eram fortes e as barreiras eram mais altas do que hoje, refletem a forma como o direito somado à esperança, à humanidade e ao humor pode vencer qualquer ideologia.

Guareschi nasceu na região italiana da Emilia Romagna, no início do século XX. Sua vida atravessou as duas Guerras Mundiais, assim como a ascensão do comunismo e do fascismo. Foi um provocador. Suas críticas ao governo Mussolini lhe renderam o ingresso forçado no exército italiano e três anos em uma prisão polonesa.

Retornou ao norte da Itália justamente no ápice dos embates entre os comunistas e os democrata-cristãos pelo controle da Itália. As tensões eram fortes entre as duas partes, os democrata-cristãos afirmando que os filhos dos comunistas tinha sido apropriados pelo Estado, enquanto os extremistas da esquerda atacavam os sacerdotes e proprietários de terra, seus maiores inimigos de classe.

Nesse clima volátil, Guareschi lançou suas sátiras tanto ao primeiro grupo quanto ao segundo, expondo os pontos fracos de ambos lados. Com isso, ajudou a diminuir as tensões entre as violentas oposições. As obras de Guareschi foram vitais para a derrota do Partido Comunista na histórica eleição de 1948. Essas histórias se tornaram extremamente populares e beneficiaram ensinamentos como os do Papa João XXIII, cujo tom pastoral refletia uma presença paternal amorosa em um mundo repleto de ódio.

As mais famosas histórias de Guareschi foram as de Don Camillo, um pároco na pequena aldeia de Reggio, em Emilia Romagna, e seu rival Peppone, o prefeito comunista da cidade. Este contraste é o ambiente de confrontos políticos e calorosos momentos de cumplicidade guiados pelo Cristo crucificado que do altar serve de moderador de consciência para Don Camillo e o tolo Peppone.

Don Camillo e Peppone formam a profunda fronteira do movimento da resistência italiana durante a Segunda Guerra. Peppone representa os "partigiani", enquanto Don Camillo encarna o capelão. O ódio pós-guerra contra os fascistas (Mussolini foi de Emilia Romagna) empurraram a região para um triângulo comunista entre Parma, Bolonha e Ferrara. Don Camillo e Peppone chocam-se constantemente, em confrontos que às vezes escapam do verbal para o físico. Mas apesar das suas diferenças, quando confrontados com questões fundamentais como a vida e a morte, o verdadeiro e o falso, eles acabam ficando do mesmo lado.

Don Camillo é frequentemente tentado pelo orgulho a permitir que a política ultrapassar o seu dever com as almas, mas, felizmente, Cristo está sempre lá para chamá-lo de volta ao caminho certo. Em um memorável episódio, Don Camillo tenta justificar o seu comportamento pecaminoso, usando uma inteligente retórica familiar com muitos políticos. Cristo o repreende dizendo: "Estas são as sutilezas dos sofistas... sem você perceber o diabo ganhou vida em ti e mistura suas palavras com as dele". Um breve período de jejum restaura a saúde espiritual de Don Camillo.

Minha história favorita está próxima do final do livro. No Natal que se aproxima, os comunistas estão-se tornando mais intolerantes com Don Camillo, que acaba de escapar de um atentado a bala. A frágil fronteira respeitosa entre ambos lados parece estar prestes a ruir. Na véspera de Natal, um oprimido Peppone, sem saber para onde se dirigir, acaba por se encaminhar à casa de Don Camillo. Os dois homens sentam-se em lados opostos da mesa, as fortes mãos ocupadas ternamente com as figuras do presépio. Esta simples mas eficaz atividade lentamente cura as feridas entre os dois homens e pacifica os caminhos na pequena aldeia do rio Po, trazendo esperança a todos aqueles que seguem o Príncipe da Paz.

[Elizabeth Lev ensina arte cristã e arquitetura no campus Italiano da Universidade de Duquesne e no programa de estudos católicos da Universidade de São Tomás]

Fonte: ZENIT permalink

3 comentários:

Vicky MundoAfora disse...

Dom Camillo é bom demais!!! Li em italiano, nao sei se tem traducao para o portugues. As conversas dele com o Cruxifixo sao aulas de vida. Vale muito a pena a leitura (os filmes sao meio pastiche).

Stella disse...

Oi Vicky,
Existe tradução das aventuras de Dom Camillo em português. Lia quando era menina. Um sos livros está tão velhinho que se desfaz ao toque. Vou tentar comprar na estante virtual. Vi os filmes e gostei pela pureza e elenco simpático. As conversas de Don Camillo com Jesus crucificado são também minhas partes favoritas. Bom feriado! um beijo,
stella

Wagner Mourão Brasil disse...

Em português, só em livros editados em Portugal. Li todos eles, e ainda me lembro das capas verde-escuro. Uma viagem.

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