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Pode até ser que o mensalão não impeça o PT de vencer a eleição para a Prefeitura de São Paulo, como indicam as primeiras pesquisas, mas me parece inegável que o partido sofrerá a médio prazo as consequências de seu desprezo pelas regras éticas na política. O PT nasceu defendendo justamente uma nova maneira de fazer política, e foi assim que chegou ao Poder, mesmo que no período anterior à eleição de 2002 já estivesse envolvido em diversas situações nebulosas nas prefeituras que vinha governando, especialmente no interior de São Paulo.
Os assassinatos de Celso Daniel, Prefeito de Santo André, e Toninho do PT, Prefeito Campinas, são dois exemplos da gravidade dos problemas que envolviam o PT já antes de chegar ao poder central do país, com irregularidades em serviços como a coleta de lixo e distribuição de propinas para financiamento de eleições.
Quando o escândalo do mensalão eclodiu, em 2005, dois dos fundadores do PT, o cientista político César Benjamin e o economista Paulo de Tarso Venceslau revelaram os bastidores da luta de poder dentro do partido nos anos 90 do século passado, ocasião que eles identificam como o “ovo da serpente” no qual teria sido gestado esse projeto de poder que acabou desaguando nas práticas de corrupção, aprofundadas quando o partido chegou ao governo federal.
Coordenador da campanha de Lula a presidente em 1989, o cientista político César Benjamin garantiu que "o que está aparecendo agora é uma prática sistêmica que tem pelo menos 15 anos no âmbito do PT, da CUT e da esquerda em geral. Nesse ponto, a responsabilidade do presidente Lula e do ex-ministro José Dirceu é enorme".
O episódio do mensalão seria o desdobramento de uma série de práticas que começaram na gestão do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) no fim dos anos 90, quando Delúbio Soares foi nomeado representante da CUT na gestão do FAT. Esse tipo de prática, segundo César Benjamin, deu "ao grupo do Lula" uma arma nova na luta interna da esquerda. O esquema de Marcos Valério foi apenas um upgrade na prática de desvio de verbas públicas para financiar campanhas eleitorais.
"Esse esquema pessoal do Lula começou a gerenciar quantidades crescentes de recursos, e isso foi um fator decisivo para que o grupo político do Lula pudesse obter a hegemonia dentro do PT e da CUT", garantiu Benjamin.
Paulo de Tarso Venceslau, companheiro de exílio do ex-ministro José Dirceu, foi expulso no começo de 1998 depois de denunciar um esquema de arrecadação de dinheiro junto a prefeituras do PT organizado pelo advogado Roberto Teixeira, compadre do presidente Lula, na casa de quem morou durante anos.
Um relatório de investigação interna do PT, assinado por Hélio Bicudo, José Eduardo Cardozo, hoje ministro da Justiça do governo Dilma, e Paul Singer concluiu pela culpa de Roberto Teixeira, mas quem acabou expulso do partido foi Paulo de Tarso Venceslau.
Ele identifica esse episódio como o momento em que "Lula se consolida como caudilho e o partido se ajoelha diante dele". Para ele, "o poder do Lula passou a ser quase que absoluto diante da máquina partidária. Um caudilho com esse poder, um partido de joelhos e um executor como o Zé Dirceu, só podia levar a isso que estamos vendo hoje", garante Venceslau. Segundo ele, na entrevista daquela ocasião, "evidentemente que Lula não operava, assim como não está operando hoje, mas como ele sabia naquela época, ele sabe hoje, sempre soube".
A reação do PT ao julgamento do mensalão tem obedecido a uma oscilação que depende dos interesses políticos do partido. Da reação inicial de depressão e pedido de desculpas à afirmação de que o mensalão não passava de caixa 2 eleitoral, o então presidente recuperou forças para se reeleger.
A partir daí, o mensalão passou a ser “uma farsa”. Agora, que o esquema foi todo revelado à opinião pública, o PT diz que o julgamento é um golpe dos setores reacionários do país contra um governo popular. O que importa é vencer a eleição no segundo turno em São Paulo, comanda José Dirceu, como sempre comandou. O mensalão não terá a menor influência no eleitorado, diz o imediatista Lula, que pensa na próxima eleição sem pensar na próxima geração.
Os ensinamentos que o episódio poderia proporcionar ao partido, permitindo que recuperasse o rumo que, pelo menos em teoria, era o seu quando da sua fundação, vai sendo engolido pelo pragmatismo que levou o PT onde está hoje: no poder, mas em marcha batida para se transformar em mais uma legenda vulgarizada pela banalização da política.
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